Conviver em sociedade consiste em
um acatamento de ordens e preceitos que são julgados indispensáveis por cada
indivíduo que a constitui, para que de fato, esta sociedade possa existir. Em
suma, esses direitos estabelecem dois pontos: direitos e deveres, ou em uma
segunda análise, recompensas e punições.
Para
manter esse regramento, uma sociedade acaba desenvolvendo dispositivos que irão
reger essas regras, são as chamadas instituições. Entre essas instituições, na
sociedade cotidiana, pode-se citar como exemplo a família, religião e Estado.
Estas instituições são as mais tradicionais e reconhecidas desde a história
antiga da humanidade, mas hoje pode-se acrescentar ainda a estas, o poder
econômico.
Como
uma análise de instiuição de controle, a religião se mostrou uma das mais
eficientes desde a antiguidade seu reflexo é muito forte até os dias atuais.
Toda essa eficiência deve-se ao aspecto que ela exerce sua influência
diretamente sobre a parte moral do comportamento humano, fornecendo respostas
para dois conceitos inerentes à consciência humana e que todos os indivíduos
procuram desde o início de suas vidas até seus últimos suspiros: Bem e Mal ou
Certo e Errado.
Todo
ser humano tem uma necessidade incólume de encontrar respostas para tudo, só
que as respostas, em sua grande maioria, são muito mais complexas e difíceis de
serem encontradas do que as perguntas que são elaboradas. A religião é o
caminho mais rápido e fácil de se chegar a essas respostas de difícil
complexidade. Em uma análise rápida, sem muita pesquisa, tudo que é
inexplicável pela ciência do conhecimento humano, encontra resposta rápida nas
divindades ou no sobrenatural, independentemente de qual cultura se está
analisando, seja ela ocidental ou oriental. Hoje, a idéia de que o planeta
terra é achatado e que na borda que delimita o seu fim existem monstros
marinhos que devoram tudo que dela cai parece ridícula, mas a aproximadamente
500 anos, quem discordasse disso era considerado “maluco ou herege”.
O
que absolveu os “malucos ou hereges” de aproximadamente 500 anos atrás foi o
conhecimento, por meio da comprovação científica de uma realidade que até então
era ignorada. Esse foi mais um dos embates que desde o princípio vem ocorrendo
entre o conhecimento e a religião. Talvez, em um futuro próximo ou distante,
chegue-se a conclusão de que conhecimento e religião são a mesma coisa, pois um
pode promover a evolução do outro a fim de que seus conceitos se complementem.
Todavia, atualmente e desde a origem de ambos, a guerra é declarada.
Na
bíblia cristã, no próprio livro de Genesis, fica explícito que o conhecimento
foi a queda do homem e é justamente esse conhecimento, que é demonizado em
várias religiões, que tem sido o algoz dos mecanismos de controle não só de
religiões como por exemplo de Estados. A ciência é lenta e falha, isso
assumidamente, porém quando se manifesta ela apresenta provas que comprovam
suas teorias, mesmo que estas possam ser refutadas. Já a religião não, ela
apresentou-se e apresenta-se em grande maioria dos casos como absoluta e
infalível, portando respostas simples e sem comprovação, baseada em testemunhos
e sempre atribuídas a um poder superior. Com tudo que já foi feito em nome,
razão ou conseqüência deste poder superior, deduz-se que este tem as costas bem
largas.
A
bússola moral do ser humano, na grande maioria dos indivíduos, não é fixa, ela
é móvel e varia de acordo com o meio social ao qual o individuo pertence. Mas
por mais que os influenciáveis sejam a maioria, existe uma minoria que independentemente
da cultura em que tenha nascido, compreende o valor universal da humanidade que
deságua em um único ponto: preservação da vida, não apenas a humana e não
apenas no sentido biológico. Para estes não há necessidade de que qualquer
religião lhes diga o caminho a seguir, no íntimo destes, já está impresso o que
é certo ou errado. Para os demais, nos quais essa bússola moral está oscilante,
a religião chega como resposta da questão do certo ou errado. É aí que está a
armadilha.
Em
uma primeira análise, algumas religiões também aparentam direcionar para o
valor da preservação da vida, mas no momento em que estas criam os conceitos
repressores de bem e mal, certo ou errado, elas estabelecem mecanismos de
controle que nem sempre vão em direção à preservação da vida, valendo-se principalmente do medo que incurtem.
Ao
analisar a vida no planeta terra como um todo, onde tudo está interligado,
pode-se chegar a conclusão de que na verdade, toda a humanidade e o ecossitema
são passageiros de um barco no oceano. Conceitos de Religião e Estado, nada
mais são do que formas de confinamento desses passageiros nas cabines do barco.
Se uma religião segue a bandeira de que há um povo escolhido e um povo excluído
já pegou a contramão da idéia de que todos provêm da mesma fonte e, ainda, se
outra religião se apega ao conceito de que há uma fonte criadora de imensa
sabedoria, amor e piedade, e que os
povos que são infiéis a essa fonte criadora, merecem serem punidos por ordem da
fonte, atestam que talvez essa fonte não seja assim tão sábia, amorosa e
piedosa.
Neste
ponto, não entra-se no mérito da questão da fonte criadora. Esta não passa de
vítima de distorções de conceitos para servir a propósitos humanos. Não foi
uma, nem duas vezes que foi usada uma divindade como pretexto para
sacrifícios, aumento de impostos, guerra ou assédio moral. Aqueles, cuja a
bússola moral é fixa, que ousaram contestar a verdades absolutas e sem
explicação sempre foram vistos como infiéis ou loucos, sendo automaticamente
excluídos das sociedades as quais pertenciam. Na verdade os infiéis e loucos
assim era classificados porque representavam algum risco ao controle que
determinada religião exercia sobre uma sociedade contestando, via de regra, as
autoridades sacerdotais e escrituras tidas como sagradas.
Com
relação à escrituras sagradas, todas, sem exceção, foram feitas por mãos
humanas, alegando-se a inspiração divina. Só que ao serem estudadas, fica
nítido o propósito de conciliar uma visão humana em favorecimento de um
determinado grupo e que a mensagem final possa arregimentar novos seguidores a
fim de fortalecer o séquito original, tornando-o superior aos demais. Em
verdade, religiões auxiliam em uma formação de conceitos humanistas, porém elas
erram ao pregarem que estes conceitos devam pertencer a grupos ou que seja
necessária uma conversão para que tais conceitos possam verdadeiramente levar a
uma salvação divina.
A defesa da
vida e proteção dos fracos são verdades que já estão impressas na psique
humana, ainda que inconscientemente. No íntimo, o grande sabe que é responsável
pelo pequeno e que tirar vantagem deste último é errado. Nesses valores não há
necessidade de religião, porém quando alguma cultura ou civilização vai contra
esses valores, inventa-se uma religião que justifique atrocidades ou crimes
contra outros ainda que, ironicamente, alegue estar defendendo o fraco ou
minorias menos favorecidas. A principal ferramenta para isso são os sacerdotes
e escrituras que se tornam incontestes por serem o elo com o divino. Estes se
tornam os principais agentes de repressão contra aqueles que, por terem
conhecimento, questionam o sistema como ele se apresenta.
Por
fim, como foi mencionado, todo ser humano sabe em seu íntimo o que é bom ou mau
para ele e seus semelhantes, isso está em seu DNA, mesmo que isso seja ignorado
e não posto em prática. Talvez esse conhecimento enterrado, sutil e furtivo
seja a “espiritualidade” individual que todos possuem, o pedaço da mesma fonte
cósmica original que criou tudo, ou para alguns, a fagulha de Deus.
Individualmente, a fé aliada com a religião ajuda no desenvolvimento dessa “espiritualidade”,
mas em sociedade a religião torna-se uma faca de dois gumes, que ao mesmo tempo
pode libertar alguns e aprisionar outros. 




